quinta-feira, 16 de setembro de 2010

IARA

Josemário Fernandes.

Moça do corpo

De barro de loça

Beradeira menina

Sereia d’água doce.

Banhe teu canto

Molhado de encanto

Afogue tuas máguas

No porto-remanso.

Lave tuas dores

Encharcada de pranto

Deixe correr para o mar

Ou atolar-se na lama.

Ribeirinha menina

Pescadora de sonhos

Vem ancorar teu amor

No porto das ondas.

Vem remar ao encontro

Onde nasce a fonte...

Vertente da vida

Curso das águas

Pé-de-banco do leito,

Margem da saudade...

Moça ribeira

Estrela do rio

Musa roceira

Iara de abril...

Fonte corrente

Nascente poética

Barranco das lendas

Encosto dos versos.

Franciscana menina

Tece teu canto de amor

Dance ao balé das maretas

Foz-canção de pescador.

Sente na proa do barco

Conte a Opará teus segredos

Faça uma prece a Yemanjá

Deixe afogar os teus medos

Só não mergulhe no fundo, menina!

Por que água não tem cabelo...

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

TECENDO LEMBRANÇAS

Gilberto Morais & Josemario Fernandes



Ao brilho da lua,

Na calmaria das maretas,

O vento norte sopra sereno.

Balançando os velhos paquetes,

E eu todo saudoso, relembro

teço lembranças e segredos.



Meus olhos perdidos,

Avistam os barrancos

Onde dantes ali ficava,

Peixes debaixo dos mangues,

Passarinhos bebendo água,

E bichos d´agua no remanso.



Pesco em me a saudade,

Dos tempos fartos de outrora,

Dos cardumes e arribadas

Da piracema na desova,

Dos vapores e pescadores

de Juazeiro a Pirapora.



Dentre a noite e meia,

Reunidos no terreiro

A vizinhança ali ficava,

A luz de vela ou cadêeiro,

A debuiar feijao milho

Aos contos de canoeiros.



Dormia ao som da viola,

Acordava no canto da passarada

Com os braços firmes e fortes,

Ia pro rio pegar água

Pedia a benção ao velho chico,

Que de benção me molhava.



E pela luz das estrelas

No breu da noite eu seguia

No carreiro bem estreito

Caminhava todo dia

Para ver a minha prenda

Com o nome de maria.



O coração palpitava

Feito zabumba nervoso

Pois os olhos de maria

Era um rio de tão formoso

Uma lavoura de rosas

Uma plantação de mimoso.



...

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

HOMEM E FILHO FEITO DO VENTO E FERRO
Gilberto Morais & Josemar Sanntos

O sol seguiu alto
E o vento veio vacilando veredeiro
Soprando seco, os meus sonhos... Sofridos, sabe?
E na fissura que corre o gozo, como um furacão perdido!
Fez-me fisgar um filho com essa fêmea fugaz,

O ferro foi-lhe aferroando, ferrageiro.
Por dentre o corpo insensível, denso e fundo
Forjou-se o fruto, de suas entranhas,
Fez-se o frio a fim de findar o fogo
E forjar-se fuga...

E em frente aos juízes, o ar
Varreu-o à vereda para o veredicto!
Salivou ares, dos braços sabíveis
Fabricou-se do ferro leve, que ferve pra ser ferrado,

Esse menino é de ferro, formou-se para ser fundido
Eu sou a fôrma, e ele a forma e o vestígio
De um destino incerto
Das minhas mãos as marcas de uma prole,
Vazão do calor da batalha.

O vento foi lhe vacilando, veredeiro
Nu voando de seu ventre
Sorrindo surpreso, e chorando contente
Fez-se freio em meu peito frágil.

Vendo avançar desde já, a morte variante
Só o destino segue esse suco alcoolizante
E faz um fumo tão forte de fechar as fontes.

O sangue queima nas veias
Quando a recusa a vontade peia
E flecha o alvo, no ato de acertar
O peito aberto onde a renúncia sangra
A recusa do destino

Pai e mãe esvairam-se de mim, numa ventania
Sou sozinho nesse ar,
Fizera de mim pó nas fácies dessa ferrovia

Ferro e fôrma finalizaram-se na ferrugem
Corroeram-se na ânsia do deleite
Traçando seus próprios destinos

O vento solto seguiu nas veredas
Destinando o próprio destino traçado

Voei como pluma no ciclone!
Só hoje sou fuga, de todos os estragos dos meus Antepassados
Faço fabrica de sonhos!


Meu corpo desprovido de freios
Ganhou liberdade, fugindo do mundo
O ar que foi brisa tornou-se vento

E o vento veio depressa veredeiro
Rasgando feito flecha
Meus suspiros
Aventurando caminhos
Refluindo o destino
E minerando minha alma..